Este vídeo resgata trechos de apresentações de dança afro (mas não só) realizadas em lançamentos de Cadernos Negros e Sarau Afro Mix. A presença da dança afro nos eventos de lançamento é antiga, tendo se iniciado com o lendário grupo Afro II (do qual não temos imagens) no final da década de 80. Este vídeo traz o grupo Koteban (de vermelho), Umojá (de branco) e Omo Aiyê (nas outras imagens), além de Nino Brown, com o seu “soul”. Que as danças sejam inspiradoras e nos lembrem de nossa ancestralidade. Ah, aumente o som e dance também.
13 de maio: a literatura afro tem em Lima Barreto um de seus precursores. Na verdade a tradição da literatura afro tem sido mais uma descoberta, como várias outras coisas nesse campo. A começar pela própria denominação, que tem sido uma descoberta constante. Uns preferem literatura afro, outros, literatura negra. Na verdade, os termos não se excluem. Afro tem a ver com a cultura, como na dança afro, os blocos afros, a religião afro-brasileira. É mais ancestralidade na fita. Negro tem um sentido mais político, como na denominação “movimento negro”, por exemplo. Enquanto afro remete à história, negro parece mais ligado à biologia, à ideia de raça.
A palavra “negro”, termo de origem espanhola e portuguesa para “preto” (a cor preta), na mente doentia ocidental durante muito tempo significou o mesmo que “escravo”. Ressignificada politicamente pelos movimentos, tornou-se categoria sociorracial. “Afro” ao que parece foi criado pelos negros americanos livres do século XIX. Já que o adjetivo mais correto para quem vive ou tem origem na África seria “africano”, afro nasce como um termo da diáspora. Uma “descoberta” também. Negro, preto ou afro? Sabe-se lá, a discussão é complexa e até um pouco metafísica. Mas não fútil. Nos EUA essa discussão semântica também acontece faz tempo, como se pode ver aqui no artigo do editor da Revista Ebony, Lerone Bennett, Jr., artigo da década de 60 que transcrevemos para o português (clique para ler).
Nomear também é criar o mundo e essa conversa vai longe. Mas é lógico que quanto mais opções no vocabulário, melhor. E voltando ao Lima Barreto: 13 de maio também é dia dele!
É isso mesmo. Cadernos Negros 36 foi lançado num evento muito legal. Em breve postaremos algumas fotos. Você já pode encontrar o 36 na lojinha do Museu Afro, no Ibirapuera, em São Paulo. Em Belo Horizonte você pode encontrar na Nandyala ou também pode solicitar pelo correio.
SEXTA 13 SERÁ UM DIA DE SORTE – LANÇAMENTO DO CN36
Lançamento do livro CADERNOS NEGROS VOLUME 36 – CONTOS AFRO-BRASILEIROS.
Vai ser dia 13 de dezembro, sexta-feira, às 19h30
No auditório da Academia Paulista de Letras (um espaço central amplo e agradável)
Largo do Arouche, 312 (próx. à floricultura) – Metrô República
Entrada Franca
Com a presença de alguns autores do livro residentes em São Paulo e Brasília e algumas participações especiais.
Autores do livro: Adilson Augusto, Cristiane Sobral, Cuti, Elizandra Souza, Fausto Antônio, Hildália Fernandes, Jairo Pinto, Lande Onawale, Lepê Correia, Michel Yakini, Serafina Machado, Sergio Ballouk, Silvana Martins, Valéria Lourenço
Haverá a minipalestra “Literatura Afro X Literatura Periférica: Contemporaneidade”, com Michel Yakini, do coletivo Elo da Corrente e da Usp.
No evento de lançamento haverá a participação super-especial do cantor
Fabiann Ifrikan (músico da Guiné-Conacri)
Também haverá as participações das cantoras Liah Jonnes e Débora Garcia e de Cosme Nascimento na percussão.
E não poderia faltar: dança Afro com o grupo Omo Aiyê.
Inscrições devem ser feitas pelo site do Quilombhoje (www.quilombhoje.com.br / www.quilombhoje2.com.br/blog) ou neste endereço:
https://docs.google.com/forms/d/1Ve9isjsquLNL9pMmpmPIzzZZPeAQFrWdsxpt0iWhgKA/viewform
CADERNOS NEGROS VOLUME 36
Este volume 36 de Cadernos Negros continua a história da série criada em 1978 por Cuti, Hugo Ferreira, Jamu Minka e outros. Desde sua criação, a série tem seus volumes feitos de forma coletiva.
Com 14 autores e dezesseis contos, o livro de 128 páginas traz textos que falam de temas muito próximos a todos, como afetividade, relacionamentos, sobrevivência; traz temas atuais, como futebol, infância e educação; são contos criativos, relatos que dão um agudo retrato de diversos aspectos da vivência afro-brasileira contemporânea.
Lançar mais um Cadernos num ano em que se falou tanto da exclusão de escritores afrodescendentes, cujos textos são tão ricos, mas ainda não tão lidos como deveriam, é algo de profundo significado para os atuais coordenadores da série: Esmeralda Ribeiro e Márcio Barbosa.
Cadernos 36 certamente colaborará para dar mais visibilidade à literatura afro.
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Aqui você pode visualizar o mapa do local:
Ver mapa maior
Aqui está o flyer eletrônico:
No dia 28 de setembro, próximo sábado, vai acontecer mais uma edição do Sarau.
Vai ser no Museu da Língua Portuguesa, na Praça da Luz, s/n – SP – metrô Luz.
Começará às 16h (na edição passada do Sarau algumas pessoas chegaram após o término. O Museu estará fechado após 18h). A entrada é franca.
Haverá a participação de Adilson Augusto, Akins Kinte, Esmeralda Ribeiro, Márcio Barbosa, Sergio Ballouk, Sidney de Paula, Thyko de Souza, dentre outros autores…
E a participação especial da cantora Liah Jones e de Cosme Nascimento na percussão. Também haverá a performance de Dança Afro com Edinho Pombe Oriba.
FRENTE NEGRA BRASILEIRA:
GESTANDO UM PROJETO POLÍTICO PARA O BRASIL
Por Márcio Barbosa
Nem sempre o protagonismo afro-brasileiro é lembrado de forma positiva ao longo da história. A nós os relatos oficiais geralmente reservam o papel de coadjuvantes nos grandes eventos, especialmente naqueles que ajudam a definir a situação sociopolítica do país. Quando não nos dão esse papel, tentam desqualificar nossa luta rotulando-a de diversas maneiras negativas.
No entanto, uma consulta a livros e teses que vêm sendo produzidos ao longo dos anos dentro da própria comunidade e por estudiosos, afrodescendentes ou não, revela que o protagonismo do povo negro ao longo da história foi e é muito intenso.
O pós-abolição, por exemplo, é rico em termos de criação de associações afro-brasileiras, na sua maior parte com atividade de lazer e de cultura. Outras entidades tinham caráter assistencialista. Algumas se dedicaram à publicação de jornais numa época em que os índices de analfabetismo eram terríveis.
Em São Paulo uma das entidades mais conhecidas foi o Centro Cívico Palmares, fundado em 1926. Essa associação ultrapassou os limites das entidades recreativas ao pautar o tema da participação política.
Em 1931 surgiu a Frente Negra Brasileira, aprofundando os temas que o Palmares esboçara e atingindo um nível de organização e atuação que a faria ser lembrada através das décadas. Fundada no dia 16 de setembro no salão das Classes Laboriosas, constituiu sede posteriormente na Casa de Portugal, na avenida Liberdade. Nesse local, a Frente Negra manteve escola, departamento de assistência social e jurídica, grupo de teatro, jornal, além de promover palestras e os grandes bailes organizados pelo grupo das Rosas Negras, dentre outras atividades.
É importante notar o contexto em que a Frente Negra surge. Em depoimento para o livro “Frente Negra Brasileira”, Aristides Barbosa afirma que, ao chegar em São Paulo vindo da cidade de Mococa, encontrou no bairro da Bela Vista os homens negros desempregados nas ruas. As mulheres é que, trabalhando como domésticas, arcavam com o sustento das famílias.
Na época grassavam as absurdas teses do racismo científico, para o qual negros e mulatos formavam uma raça degenerada e por isso estavam fadados ao desaparecimento. Entre os adeptos dessa concepção de raça estavam Nina Rodrigues e Monteiro Lobato. Essas teses transformaram-se em políticas públicas, com o incentivo à imigração europeia dando corpo ao desejo de embranquecimento, pois para os ideólogos do Brasil do início do século o país só atingiria o status de “civilizado” quando a “raça degenerada” desaparecesse do seio de sua população. Os anúncios de jornais da época estampam anúncios que procuram por empregados brancos.
Nesse sentido a Frente Negra estabeleceu um projeto político de inclusão do povo negro na sociedade brasileira. Nos estatutos da Frente afirma-se que a entidade “visa à elevação moral, intelectual, artística, técnica, profissional e física; proteção e defesa social, jurídica, econômica e do trabalho da Gente Negra”. Esse objetivo amplo foi perseguido com tenacidade, podendo-se destacar nesse passo algumas diretrizes centrais de ação:
- a construção da ideia de comunidade, independentemente de cor de pele, com uma história comum, um passado comum, com heróis como Zumbi e Henrique Dias; elabora-se aqui uma identidade negra;
- a educação como um fator de superação da situação atual (a educação pode ser formal, como na escola frentenegrina, mas pode ser mais geral, humanista, como nas palestras, no teatro, nas leituras de poesia, no incentivo à leitura de livros);
- atuação político-partidária para alcançar objetivos mais amplos.
Deve-se notar que essa ação é pensada em termos nacionalistas. Para os frentenegrinos, o negro, por sua contribuição à construção do país, deve levar sua luta em termos nacionais, tem direito à terra, tem direito a participar da vida política e da tomada de decisões e especialmente deve pensar na disputa de poder. Embora houvesse informação dos movimentos internacionalistas, como o da volta à África, de Marcus Garvey, a Frente concebe sua atuação somente em termos de Brasil.
A unidade pretendida pela Frente Negra teve resultados concretos. Alguns autores afirmam que ela chegou a ter duzentos mil filiados em todo o Brasil, com ramificações em vários Estados. No Recife, o poeta Solano Trindade chegou a criar a Frente Negra Pernambucana. A carteirinha da Frente valia como um documento de identidade. Em 1936 a Frente foi registrada como partido político. O primeiro partido político negro brasileiro.
Dirigida por afro-brasileiros que tinham superado a barreira do analfabetismo e se tornado professores, a Frente teve de lidar com diversas contradições. Seu primeiro Presidente, Arlindo Veiga dos Santos, era patrianovista, isto é, monarquista, e, embora sempre afirmasse que essa sua posição não interferia em seu papel como frentenegrino, as maiores críticas à Frente e muitas das cisões que surgem derivam dessa postura e da linha autoritária que a diretoria teria imprimido à Frente, com a formação, por exemplo, de uma milícia. Logo no seu início, o grupo do jornal Clarim da Alvorada, de José Correia Leite, rompeu com a Frente Negra. Na Revolução de 1932, ela decidiu por se manter neutra, não aderindo à luta empreendida pelos paulistas. No entanto, houve uma cisão e de dentro da Frente saiu um grupo que formou a Legião Negra para lutar ao lado dos paulistas.
Em 1937 um decreto de Getúlio Vargas que colocava na ilegalidade todos os partidos políticos atingiu também a Frente Negra, provocando seu fechamento. Ela ainda tentou se rearticular como União Negra e depois como Clube Recreativo Palmares e, em décadas posteriores, houve tentativas de se reconstruir a Frente Negra empreendidas por Francisco Lucrécio (ex-primeiro secretário), e outros, mas a época de ouro havia terminado.
Porém, a Frente permanece atual, talvez porque tenha tido o mérito de elaborar um projeto político para o negro e para o Brasil. Nesse projeto político de inclusão, a raça seria um fator de mobilização e coesão, e não de segregação, como vista e sentida no dia a dia. Agindo no sentido de privilegiar a educação, a ação cultural e a participação política baseada no que poderíamos chamar hoje de voto étnico, suprapartidário, a Frente supriu carências imediatas de parte da população negra. Ainda surgirão muitos estudos sobre a Frente, muitos deles tentando desqualificá-la, mas os temas que pautou permanecem atuais.
Abaixo, crianças na escola frentenegrina:
E o grupo das Rosas Negras:
Mais um belo poema. Este é de Ana Paula Fanon:
ALMA FEMININA
O risco do tempo me fez mulher
Primeiro os laços de fita, depois as tranças da ingenuidade
Foram gestando aos poucos dentro de mim a doçura!
Uma negra Dandara,
Uma candace menina,
Carrego a beleza subjetiva das águas
Os cravos do passado transformaram-se em rosas
Os espinhos de outrora
Hoje são pétalas de sensibilidade
Rosas negras espalhadas no jardim
Rosas pretas que exalam vaidade
Pérolas de ébano
A leveza da textura dos meus cabelos crespos,
O mel dos meus lábios,
A determinação das minhas mãos,
As marcas genuínas do meu corpo,
O perfume açucarado que transpira em minha pele,
O labor com as palavras,
Útero mantenedor das vidas
Sou Fêmea
Feminina
Fértil
Parideira de versos
Amante do texto vivo
Lavadeira dos resquícios históricos
Consumida pelo desejo de ser e estar no mundo
Eu sou mulher!
Yabá
Mulher de guerra e paz
Nefertiti reencarnada de saia rodada
Ocupante das encruzilhadas literárias
Orientada pelos búzios poéticos
No dia 25 de julho comemora-se o Dia Internacional da Mulher Afro-latino-americana e Caribenha. A data foi instituída em 1992, na República Dominicana, depois do primeiro encontro de mulheres negras da América Latina a fim de discutir políticas de inclusão e questões sobre discriminação racial e de gênero.
As mulheres negras prosseguem em sua luta para ocupar, de forma justa e digna, seu merecido espaço nesta sociedade. No pós-abolição foram o alicerce financeiro da família, pois os homens eram rejeitados nos empregos, e tal situação ainda prossegue em muitos lares e lugares. Guardiãs atentas de vínculos afetivos, muitas vezes são o elo que permitem a coesão e a unidade. Há muito o que conquistar, mas a certeza é de que o caminho é feito passo a passo, é feito de cada pequena meta atingida no dia-a-dia e, especialmente, é feito com perseverança e determinação.
SAUDADE
Ai, quanta saudade da mãe África.
Da mãe de fartura e do seu colo enorme,
quente e agradável.
Da mãe cheia de doçura.
Ai, que saudades da mãe África.
Da rainha mãe corajosa, guerreira e onipotente.
Estou com a saudade ardendo no meu umbigo.
Silêncio dolorido. Choro. Banzo d’além-mar.
Tudo em mim é África, verdadeira força
para enfrentar tempestades.
Tudo em mim é lembrança da liberdade vivida
em mares antes navegados.
Com a minha mãe aprendi a andar
sobre as águas profundas…
Ai, quanta melancolia nesta saudade pálida!
Escuta a minha tristeza por tantos filhos bastardos
que ainda não reconhecem a tua grandeza, mãe!
Oh, Mãe da divina providência.
Escuta a minha voz africana em terras distantes.
Traduz o meu grito incompreendido
desta diáspora em terras colonizadas.
Grito kimbundu, kikongo e ioruba.
Oh, Mãe poliglota do universo negro.
Tu, que alimenta o meu sangue e guia o meu espírito.
Vai sempre à frente, cuida do meu coração.
(poema de Cristiane Sobral publicado no CN29)