Sobre
Cadernos Negros
Volume 24
contos afro-brasileiros
Eduardo Silva
João Batista de Jesus Félix
Rhonda Collier
Escrever Cadernos
Negros e Ser negro. Como acho que as duas coisas são
muito complicadas em nosso Brasil, vou rapidamente discorrer um pouco sobre
cada uma delas.
Sobre o Ser negro: já estamos mais do que calejados e cansados de discutir
sobre as diferenças e as desigualdades sociais pelas quais a nossa
raça passou e continua passando em função de todo o histórico,
que fez com que nossos antepassados viessem forçosamente para cá,
se mantivessem aqui de uma forma humilhante e mutilante por longos anos e,
por fim, fossem despejados nas ruas com a tal mal explicada e falsa "abolição",
que, sabemos, na verdade não passou de um desemprego em massa. Mesmo
assim, heróica e bravamente, continuamos, e de forma determinante,
a ter presença fundamental em todos os segmentos. Enfim, não
conseguiram nos derrubar, nem nos fazer desaparecer, como tentaram. Continuamos
e continuaremos sempre.
Sobre o Escrever Cadernos Negros já no volume 24 , que
são de negros para todas as raças. Este trabalho de alta qualidade
e de muitos anos é mais uma prova de resistência, como as já
citadas acima, e principalmente uma das poucas e ótimas maneiras de
criar ou aumentar a auto-estima de uma raça que teve tudo para desaparecer
e, mesmo assim, continua e continua escrevendo. Continuaremos sempre.
Eduardo Silva
ator
A
presença de negros na literatura brasileira é bastante expressiva,
mas, infelizmente, a maioria de nossos autores com ascendência africana,
cujas obras tiveram grande circulação, procuraram sempre evitar
tal identificação.
Fugindo dessa rotina de alienação, os Cadernos Negros são
uma iniciativa de escritores negros militantes que obteve bastante sucesso
junto à sua população-alvo, não obstante o enorme
percentual de analfabetismo entre os negros e mestiços brasileiros.
Apesar de seu êxito, as editoras comerciais procuram ignorar olimpicamente
este fenômeno. Felizmente, os organizadores dos Cadernos Negros vêm
demonstrando que, apesar das dificuldades inerentes à sociedade hostil
aos não-brancos, é totalmente possível mantermos vivas,
com nossos próprios recursos, as nossas iniciativas político-culturais.
Os meios de comunicação estão todos a serviço
da tão criticada "democracia racial", pois é ela quem
legitima a nossa ausência na mídia - escrita, falada e televisada
-, justificando as condições sócio-econômicas a
que foi relegada a população negro-mestiça.
É contra esses inimigos que os quilombolas contemporâneos estão
lutando e obtendo uma larga vantagem. Afinal, sem sombra de dúvida,
lançar vinte e quatro edições consecutivas, sem qualquer
interrupção, é uma ação heróica,
digna de reconhecimento histórico.
Boa leitura para todos e AXÉ.
João
Batista de Jesus Félix
Militante do
Grupo "Fala Negão"
Professor de História Geral do CCE "Paulo Freire" e
Doutorando em Antropologia Social pela USP
O
que os Cadernos Negros significam para mim, como afro-americana?
Cadernos Negros são uma mostra do talento e da luta dos negros brasileiros.
A primeira vez que os vi, fiquei impressionada com as capas que afirmam a
beleza do negro, da família negra, e da mulher negra. Ainda mais importante
foi verificar que em cada volume havia informações sobre os
participantes, valorizando-os individualmente. A poesia e os contos dos Cadernos
Negros nos convidam a leituras múltiplas e por vezes nos estimulam
a conhecer o próprio autor.
Cadernos Negros oferecem espaço para quem quiser investir seu tempo
e coração na aventura da leitura. Eles convidam os afro-americanos
a aprender o português para entrar num outro mundo, onde às vezes
nos encontramos com nós mesmos e outras vezes gritamos por não
termos entendido as experiências dos outros.
Rhonda Michelle Collier
Doutoranda em
Literatura Comparada pela "Vanderbilt University", Nashville, Tennessee,
EUA
Cadernos
Negros volume 24, contos afro-brasileiros. São Paulo: Quilombhoje,
2001. R$ 15,00
Autores:
Cristiane Sobral, Cuti, Esmeralda Ribeiro, Fausto Antônio, Henrique
Cunha Jr., Lia Vieira, Márcio Barbosa, Miriam Alves, Vera Lucia Barbosa,
Waldemar Euzébio Pereira, Zula Gibi.